O desprezo pelas edições em CD de discos antigos parece ser comum nos PALOP.
Também no Brasil existem preciosidade que nunca foram editadas em CD.
Como exemplo citamos O LP 'No Sub Reino dos Metazoários', de Marconi Notaro, é dos expoentes da cena psicodélica nordestina. Lançado em 1973, enquadra-se na linha de obras como os discos de Lula Côrtes & Lailson - 'Paebirú' e 'Satwa', clássicos da psicodelia nacional.
Ultra-psicodélico em alguns momentos, como na faixa, o disco abre com o samba 'Desmantelado' (composto por Notari em 1968, "nos áureos tempos do Teatro Popular do Nordeste), com o regional formado por Notari, Robertinho de Recife, Zé Ramalho e Lula, entre outros. A segunda faixa, 'Ah Vida Ávida', com 'Notaro jogando água na cacimba de Itamaracá', mais Lula na 'cítara popular' e Zé Ramalho na viola indicam o que vem a seguir, um misto de alucinada psicodelia com pinceladas da mais singela música popular, como o frevinho 'Fidelidade' (... "permaneço fiel às minhas origens, filho de Deus, sobrinho de Satã" ...).
O momento mais radical disco álbum é a quinta faixa, 'Made in PB', parceria de Notaro com Zé Ramalho, um rockaço clássico, destacando a guitarra distorcida de Robertinho de Recife e efeitos de eco. As músicas 'Antropológicas 1' e 'Antropológica 2', como a maioria das outras canções, são improvisos de estúdio, reunindo os músicos já citados, com ótimo resultado sonoro e poético.
Com produção do pessoal do grupo multimídia de Lula Côrtes e sua mulher Kátia Mesel, o disco foi gravado nos estúdio da TV Universitária de Recife e da gravadora Rozenblit, também na capital pernambucana. A capa é um desenho de Lula Côrtes, tão chapado esteticamente quanto o som que o tosco papelão embalava, com um foto de Marconi Notaro no centro, com o rosto dividido entre a capa frontal e a contracapa.
O álbum, infelizmente, como a maioria do catálogo da Rozenblit permanece inédito, esperando uma cuidada reedição oficial. O LP original é praticamente impossível de ser encontrado, mas uma ótima cópia em CDr já circula no universo de colecionadores.
The Galaxies
- The Galaxies
Lançado em 1968, The Galaxies, uma das maiores raridades da garagem e da psicodelia tropical, foi gravado pelo selo Som Maior, em São Paulo. Formado pelo inglês David Charles Odams (guitarra e vocal), pela americana Jocelyn Ann Odams (maracas e vocal) e pelos brasileiros Alcindo Maciel (guitarra e vocal) e José Carlos de Aquino (guitarra e bateria), o grupo destacou-se no circuito de garagem da capital paulista.
O repertório do disco traz clássicos como o original Linda Lee e os covers para I’m Not Talking e Orange Skies e Que Vida, ambas do grupo americano Love, além de outras peças de blues e sucessos da época. Apesar das dificuldades de gravação da época, o álbum tem boa qualidade técnica, instrumental e vocais bem colocadas, particularmente devido ao domínio que seus integrantes tinha do inglês.
Também tocou no disco o guitarrista Carlos Eduardo Aun (Tuca), que não aparece na ficha técnica porque, na mesma época, era titular dos Baobás. Inédito em cd, é um dos álbuns mais procurados pelos colecionadores inte Spectrum
- Geração Bendita
Era 1971, dois anos pós-Woodstock, e a juventude brasileira ainda vivia os efeitos da "Era de Aquarius", mesmo que de forma uma pouca tardia. Em meio a onda de paz e amor, um grupo de jovens músicos e cineastas de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, mergulhou fundo na produção do que se chamou na época de "o primeiro filme hippie brasileiro". Intitulado "Geração Bendita", o filme dirigido por Carlos Bini, e rodado na região, deixou registrado, além das imagens de uma época, uma trilha sonora tão surpreendente quanto rara.
Gravado nos estúdio da Todamérica, no Rio de Janeiro, o disco também chamado "Geração Bendita" é assinado pelo grupo Spectrum, formado por ex-membros da banda 2000 Volts e atores/músicos do filme. Integravam o grupo os músicos Caetano, Serginho, David, Fernando e Toby, que dividiam os instrumentos e as composições feitas em parceria. Com idade média de 21 anos, a experiência do grupo resumia-se à cena local, onde iniciaram tocando covers de Beatles "tão bem feito que chegavam, por vezes, a achar que o som era de rádio, ou de gravador", diz hoje o guitarrista Caetano.
O álbum com pouco mais de trinta minutos reúne doze canções, com letras em português e algumas em inglês, em sua maioria falando de paz, amor liberdade, natureza e outros temas e valores expressivos do período. O instrumental, com profusão das fuzz-guitar a varrer, e os vocais à la Beatles, sintonizavam com a produção mundial e situava o trabalho do grupo acima do padrão nacional da época. Caetano lembra hoje que o disco chamou a atenção dos disc-jockeys Big Boy e Ademir, mas acabou ignorado pelo mídia. Espaço natural para divulgação do álbum, o jornal Rolling Stone, em sua versão nacional, só veio a público no início de 1972, quando o grupo já não mais existia.
"Não tinhamos recursos técnicos, os instrumentos eram nacionais, de segunda, terceira mão, mas havia uma coisa maior que nos movia, que era o sentimento daquela geração", conta Caetano, que ainda tocou por algum tempo na região. Tanto ele quanto outros integrantes da banda, ainda moram em Nova Friburgo e partilham com a cidade e inúmeros hoje ilustres moradores a memória daqueles "momentos mágicos, coloridos e intensamente vividos". Recentemete, por iniciativa de Caetano, e de outros remanescentes do movimento, chegou-se a tentar a realização de um festival, que resumiu-se em uma sessão do filme, sem ir adiante.
Nova Friburgo e outras cidades da Região Serrana do Rio de Janeiro foram pólo de atração de grupos musicais e comunidades hippies que para lá transferiram-se em busca de "paz, harmonia e contato com a natureza". Um dos grupos que andou por lá uns tempos foi o gaúcho Liverpool, antes de transformar-se no Bixo da Seda, em 1974. O mais famoso foi o Mutantes, já contando apenas com Sérgio Dias da formação original, que instalou-se em uma casa em Nova Petrópolis. Nova Friburgo, de forma especial, contava com uma cena local forte, com diversos grupos da região e presença de bandas do Rio de Janeiro que lá iam tocar, como A Bolha e Analfabitles, entre outras.
Apesar de ignorado em sua época, o álbum resistiu ao tempo e, hoje, ocupa os primeiros lugares nas "want lists" (procurados) de colecionadores mundiais de raridades psicodélicas (é um dos lps do livro "2001 Record Collector Dreams", editado pelo austríaco Hans Pokora, que reúne capas de discos raros de todo o mundo). Um interesse que, recentemente, chamou a atenção de selos estrangeiros especializados em reedições limitadas em vinil - 180 gramas, e mesmo em cd, que buscaram contato com a banda para relançar o álbum. Assunto que vem sendo tratado junto ao selo original e detentor dos direitos de edição, podendo resultar também em uma tiragem nacional, que tornará finalmente o disco "Geração Bendita" acessível aos comuns dos mortais
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