Friday, November 06, 2009

O MESTRE


Uma das funções da rádio é espalhar magia: nós não temos cara, temos vozes, e isso ajuda a incendiar o imaginário dos ouvintes. E esta rádio de hoje, coitada, não incendeia absolutamente nada. Põe o ouvinte a um canto e diz-lhe: ouve isto, que não te maça, não te assusta, não te provoca, não te faz comprar discos."
António Sérgio, O Mestre (1950-2009)

Sunday, November 01, 2009

António Sérgio - Apagou-se o Lança-Chamas, calou-se a voz metálica


António Sérgio deixou órfã a nossa rádio.
Lembro-me das tardes chuvosas dos anos 80 a ouvir o som da frente com os surprendentes Echo & Bunnymen a tocar com os drummers of Burundi,a voz de mel dos Cocteuau twins, o poder do amor com os Sisters of Mercy, a frieza de Siouxie & Banshees ou os goticos Dead Can Dance foram sons que nunca mais esqueci e que de vez em quando escuto vindos do fim-de-tarde na cidade.
Recordo com mais saudade os Sábados á tarde. Tudo parava para ouvir o Lança-Chamas.A audição do programa era um ritual como que de reuniões secretas de uma seita preparava-se a cassete e gravava-se voz e tudo.
Não havia mais nada, nem discos há venda, nem na rádio se passava Motorhead só mesmo o A. Sergio para abarcar tantos estilos de musica "alternativa".
Algures no ano de 84/85 o programa foi suspenso na R.C. mas houve tamanha revolução nos liceus e abaixo-assinados para a RDP que tiveram de voltam com o programa no verão de 1985.
As tardes de Heavy Metal no RRV com o Lança-Chamas ao vivo eram espectaculares, lembro-me de ver o A. Sérgio na 1ª Sessão com a sua gabardine preta e a Barba Ruiva.
E a editora dança do som, era no Bairro Azul,só eles tinham os the Cure e os Chameleons e mais tarde Joe Satriani.
Ainda nos anos 90 o António Sérgio continuava a descobrir grupos no Programa a Hora do Lobo como Sassacacatufa com os pés... nunca parou.

Até que o Radialista faleceu na madrugada de sabado dia 1/11, vítima de problema cardíaco.
António Sérgio, foi um dos maiores divulgadores de música em Portugal, morreu vítima de ataque cardíaco. A voz dos míticos "Som da frente", "Lança chamas" ou "A hora do lobo" foi referência dos últimos 40 anos.

"Ao longo dos anos, o que percebi é que boa parte das pessoas de determinada idade atribui-me uma boa parte da sua formação musical, do abrir a orelhinha", dizia António Sérgio numa entrevista dada em 2007.

E, de facto, como reconheceu ontem Zé Pedro, dos Xutos e Pontapés, ele "deixa uma grande escola na maneira de fazer rádio, quer pela sua voz característica, quer pela forma como sempre se entregou à divulgação da música mais underground". O guitarrista daquela que é a mais antiga banda portuguesa no activo (recentemente assinalou 30 anos de carreira) lembrou que o lançamento do seu grupo foi apadrinhado pelo conceituado radialista.

"Durante esses tempos iniciais ele era a pessoa a que recorríamos com frequência. A amizade foi-se cimentando ao longo dos anos. A nossa relação era de grande cumplicidade", lembrou o músico.

António Sérgio é unanimamente reconhecido como "o maior divulgador da música da frente" dos anos 70 e 80 em Portugal, através de programas que marcaram gerações e abriram o país à música mais vanguardista então produzida. À carreira de radialista juntou também um percurso de produtor e editor discográfico. Presentemente, mantinha um programa activo ,"Viriato 25", na estação de rádio "Radar", tendo inclusivamente estado em estúdio a gravar o programa desta semana. Luís Montez, proprietário da Radar, garantiu já que "Viriato 25" será posto no ar, tal como o previsto. Referindo-se ao radialista falecido, Montez qualificou-o como "um mestre da rádio e uma referência", lembrando inclusivamente que ele se tornou também conhecido como o "John Peel português", nome de um famoso radialista e divulgador musical inglês.

António Sérgio estreou-se aos microfones da Rádio Renascença, em 1968, como locutor de continuidade. Entre 1977 e 1980 foi apresentador do programa "Rotação". Seguiram-se depois "Rolls Rock", "Som da Frente" (de 1982 a 1993), "Lança Chamas", e "O grande Delta", de 1993 a 1997. Em 2007, depois de dez anos na Rádio Comercial, onde dava voz à "Hora do lobo", António Sérgio viu este seu programa ser cancelado, o que chegou a originar uma onda de protestos por parte dos ouvintes. Em Dezembro de 2007, mudou-se para a Radar FM onde apresentava "Viriato 25".

Ao fim destes anos de carreira, confessava o radialista que "já não é o bichinho da rádio que morde, já sou eu que sou o bicho da rádio!". Talvez fruto dessa paixão desmedida deixou agora órfã uma legião de seguidores. Os mesmo que, tal como Pedro Mexia, director da Cinemateca Portuguesa , gostavam "da paixão sereníssima daquela voz, e daquela selecção irrepreensível".

Faleceu António Sérgio
O radialista António Sérgio faleceu na noite de sábado, vítima de um problema cardíaco, aos 59 anos, dos quais mais de 40 anos foram ao serviço da rádio, disse à Agência Lusa Luis Montez, dono da Rádio Radar.
António Sérgio fazia actualmente o programa "Viriato 25" da rádio Radar, tendo inclusivamente estado em estúdio a gravar o programa da próxima semana, que será posto no ar tal como previsto, garantiu Luís Montez.

O dono da Radar qualificou António Sérgio como "um mestre da rádio, uma referência" ou o "John Peel português". Montez afirmou que o radialista era um exemplo de trabalho e dedicação e "estava sempre preocupado com os ouvintes".

Luiz Montez contou ainda que António Sérgio foi mesmo trabalhar no dia em que morreu o pai e disse apenas: "os ouvintes estão à minha espera".

António Sérgio estreou-se na Rádio Renascença e tornou-se famoso com programas como "Som da Frente", "Lança-Chamas" ou "A Hora do Lobo", entre outros.

"Desaparece um ícone da rádio"

António Sala elogia o radialista António Sérgio pela sua importância para a rádio nas últimas décadas onde marcou várias gerações.


António Sala lembra importância de António Sérgio
"Foi um dos pioneiros do chamado estilo FM. Era um radialista de culto, com voz impar e com estilo inimitável. Tinha um profundo sentido estético", disse.

António Sérgio "parte cedo de mais" porque "com ele muito se tinha para aprender".

Já António Jorge, coordenador musical da Renascença, diz que António Sérgio "mostrou-nos coisas que nós nem sonharíamos" e "marcou a forma de estar e fazer rádio em Portugal".


António Jorge e a magia da rádio de António Sérgio

"Estou na rádio para a servir e não para me servir dela", disse António Jorge, citando o próprio António Sérgio.

Morreu "o último dos artífices deste ofício que é a rádio", acrescentou.