Thursday, September 22, 2005

Notas sobre Nada-Aquela Maquina

Quem é que não se lembra do poderoso jingle cantado por FERNANDO GIRÃO "Aquela Máquina" um marco historico na publicidade em Portugal (1974). Aqui ficam algumas lembranças desse tempo e da empresa.
Aqui fica a analise do fenomeno regisconta há 22 anos atrás:

AS VOLTAS QUE A PUBLICIDADE DÁ

Se há actividade que, nos últimos anos, tenha dado voltas sobre si mesma, evoluindo e regredindo sucessivamente, até voltar praticamente ao que era dantes - é a actividade publicitária. Peço licença para falar um pouco do meu caso pessoal, pois acho que a minha experiência pode muito bem servir de exemplo para o que pretendo demonstrar. Quando comecei, timidamente, a fazer "umas coisinhas" de Publicidade, nos princípios dos anos 50, apanhei alguns dos maiores vexames da minha vida. Recordo-me de uma vez em que entrei, cheio de ilusões e de auto-confiança, no escritório do gerente de uma empresa de electrodomésticos, que estava certo de convencer a ser o patrocinador de um programa de Rádio que tinha imaginado e pretendia produzir. O sujeito ouviu-me com toda a atenção - até ao momento em que eu pronunciei a palavra "publicidade". - "O quê!" - disse ele - Você vem pedir-me dinheiro para publicidade? Você trabalha nisso?' .... E quando eu, já um pouco abalado pelo tom colérico da pergunta, respondi honestamente que sim - o homem ficou encarnado de raiva e berrou: - "Rua! Não quero aqui gente dessa!" E fui mesmo posto na rua, sem mais cerimónias. Para aquele senhor (e para muitos outros, dessa época) os publicitários estavam incluídos na grande classe dos vendedores de "banha-de-cobra", que abarcava outras sub-espécies com nomes sonoros, como "trapaceiros", "aldrabões" e outros piores. Porquê? Porque, digamos a verdade, alguns dos "publicitários" desse tempo mereciam, realmente, essas classificações, tão violentas quanto justas. O que se fazia, então, para conquistar um cliente (desde as ofertas de prendas, mais ou menos caras, até à utilização descarada de simpáticas "meninas", mais ou menos baratas, passando pela partilha, mais ou menos secreta, das comissões de angariação) era matéria para um "Tratado-de-Falta-de-Ética" bem volumoso. Aliás, essa coisa da Ética, poucos publicitários da época sabiam ao certo o que era. É que muitos deles tinham uma preocupação básica, inclusivamente a nível escolar, que deixava bastante a desejar. Grandes agências, havia poucas e foi, precisamente, com o aparecimento de algumas mais importantes, nos anos seguintes, que a actividade publicitária começou a ser uma coisa séria. Algumas agências internacionais abriram sucursais ou criaram subsidiárias entre nós - e as formas de proceder dessa gente, mais habituada aos métodos do grande mercado e à luta frontal com concorrentes de alto nível, foram, a pouco e pouco, ajudando a criar regras de procedimento cada vez mais sérias. É de lembrar que, então, ninguém pensava em frequentar um Curso de Publicidade, em Portugal. Foi preciso esperar muitos anos, até esses cursos surgirem - e, ainda hoje, existem sérias reservas à sua eficácia e ao seu valor. Dai que todos os publicitários da minha geração sejam "tarimbeiros", que aprenderam a fazer Publicidade da forma mais difícil: fazendo-a... Errando, tateando, ensaiando, guiados pela intuição, pelo "jeitinho" que os Lusitanos sempre têm para se desembaraçarem de dificuldades, um ou outro indo lá fora ver como era, lendo umas coisas, aprendendo umas palavras sonoras em inglês, que sempre foi a "lingua oficial" da profissão, metendo a torto e a direito, nas conversas, esses termos que pareciam tão esquisitos aos não-iniciados ("copywriter", "account", 'layout", "headline", "storyboard") e fazendo por criar uma quase-mística à volta duma actividade que exigia das pessoas uma coisa dificílima e que pouca gente tem: Ideias. A pouco e pouco, foi-se dando a depuração. Foram-se sumindo os fraudulentos e foram ficando os verdadeiros profissionais - aqueles que, sem cursos, sem ajudas, sem apoios, se foram formando por si próprios, lendo, estudando, comparando, viajando, aprendendo, praticando. Assim se chegou, na década de 60, ao período dourado das Grandes Agências de serviço completo, que pegavam numa marca nova e desconhecida e a levavam aos quatro cantos da terra, fazendo milagres de imaginação para impá-la e torná-la popular. Foi o período do grande prestígio dessas agências, prestigio por vezes exagerado, tanto que um pequeno cliente se sentia normalmente intimidado e nem se atrevia a franquear as portas desses "palácios da publicidade", em que eram admitidas apenas as grandes empresas, com grandes contas, às quais se proporcionavam recepções magníficas, com espectaculares sessões de audio-visuais, com a assistência de belas secretárias, que serviam belos "whiskies", com belos sorrisos... Tudo parecia ir bem no melhor dos mundos. Só que... Só que a crise económica mundial estava à porta - e, para complicar mais ainda a vida (das agências e dos publicitários) veio o 25 de Abril, após o qual foi moda classificar a Publicidade como uma actividade "alienante", "perigosa", "reaccionária" e outros nomes piores. Ai, foi a grande queda. Muitas agências fecharam - ou, pelo menos, fecharam-se... em copas os clientes retiraram as verbas que tinham destinado às grandes campanhas, e muitos publicitários tiveram que procurar outra vida. Foi a época do big-disparate, em que era moda dizer mal da Publicidade, chamar-lhe nomes feios e atribuir-lhe boa parte dos males que desabaram sobre a Humanidade. Foram tempos negros para todos todos os publicitários desta terra especialmente para aqueles que, apesar de tudo, iam tentando ganhar honestamente a sua vida, e vendo como, lá fora, a sua profissão era cada vez mais prestigiada, mesmo em países em que o Capitalismo se considerava uma coisa horrorosa... Depois, a pouco e pouco, os detractores da Publicidade começaram a reparar que, afinal, até precisavam dela para atingirem os seus objectivos de divulgação e promoção. Paradoxalmente, descobriram que, para espalharem a ideia de que a Publicidade era uma coisa má, precisavam de fazer uma campanha de Publicidade! E assim chegámos aos dias de hoje, em que as coisas não estão muito diferentes do que eram há anos atrás. As grandes agências voltaram (talvez não as mesmas, mas voltaram). Os Publicitários voltaram a ter prestigio. Talvez, hoje, já não lancem tantos detergentes - mas lançam, com o mesmo êxito, figuras políticas.
A luta pela conquista do Cliente é cada vez mais dura. Oferecem-se comissões, percentagens, bónus e... garrafas de whisky pelo Natal. Será isto mau? Talvez. Mas mostra, pelo menos, duas coisas:
Primeira: a Publicidade é uma necessidade.
Segunda: com todos os seus defeitos, com os atropelos à Ética, com as cambalhotas que se dão para agradar à clientela, o que é certo é que todos (mesmo os que a criticam) se servem dela!
Daí que a Publicidade esteja, de novo, numa "boa". Talvez bastante mais consciente do seu papel, depois do "susto" que apanhou. Mas em alta progressão. Pagam-se bons ordenados a quem tenha boas ideias, coisa rara, como sempre. E a nova alta da Publicidade dá-se, não só através do trabalho nas Agências, mas também da actividade desenvolvida nas Empresas, através dos seus Departamentos de Publicidade próprios. Como é o caso da Regisconta. O valor da Publicidade está, pois reconhecido universalmente, sob todos os regimes e em todos os quadrantes. Passou vitoriosamente todas as crises. Vive. Os Empresários (agora não só os mais avançados, mas praticamente todos) reconhecem a Publicidade como uma necessidade e uma indispensabilidade para ds seus negócios. Os seus gastos já não são uma despesa", mas um 'investimento" como qualquer outro. Quem não faz Publicidade, morre.


(Texto publicado no Magazine Regisconta de Janeiro/Março de 1982)

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